Prof. Jorge Timenetsky 

Basicamente estes agentes antimicrobianos podem ser conceituados como compostos produzidos por microrganismos que possuem atividade antimicrobiana bactericida ou bacteriostática. Devem ser diferenciados das bacteriocinas que também são produtos do metabolismo secundário de microrganismos. As bacteriocinas (peptídios) variam entre as bactérias e a atividade antimicrobiana destes compostos é ainda pouco conhecida. Não são utilizados usualmente no tratamento de doenças infecciosas por serem tóxicas. Atualmente existem pomadas apenas para uso tópico.

Um breve histórico

A quimioterapia no tratamento de doenças infecciosas tem sido utilizada há vários séculos. Em 1465 o mercúrio foi utilizado no tratamento da sífilis, desde 1630 os europeus utilizavam a quinina no tratamento da malária. Somente no início do século XX novas drogas revolucionaram o tratamento de doenças infecciosas.

Alguns pesquisadores daquela época são referencias conceituais e históricas. Paul Ehrlich considerou a toxicidade seletiva como uma base no uso eficaz de drogas no tratamento de doenças infecciosas. Assim a droga ideal seria aquela que destrói o agente infeccioso e que não seja tóxica para o paciente. Salvarsan (composto 606 de Ehrlich), arsênico combinado com compostos orgânicos foi o primeiro quimioterápico elaborado em laboratório e foi utilizado por muito tempo utilizado no tratamento da sífilis e que concedeu ao pesquisador o Prêmio Nobel de medicina em 1908. Somente em 1935 Gehard Domagk, trabalhando na Alemanha na Companhia Bayer com corantes na cura de camundongos infectados com estreptococos sem intoxicá-los, descobriu um corante vermelho chamado de Prontozil. Esta descoberta também conferiu o prêmio Nobel em 1939. Mas tarde verificou-se que este composto era  uma  sulfonamida. Até 1945 produziram-se milhares de derivados da sulfonamida e alguns são utilizados até hoje no tratamento de algumas infecções. A descoberta acidental da penicilina porAlexander Fleming em 1929 baseou-se na observação de que culturas e de estafilococos eram inibidas por um bolor contaminante (Penicillium). Mas somente em 1941 obteve-se uma purificação bruta do composto por Chain e Florey. Em seguida a droga começou a ser aplicada geralmente com sucesso como agente antimicrobiano no tratamento de infecções bacterianas. Em 1945 os pesquisadores ganharam o prêmio Nobel. Diversas outras descobertas importantes nesta area ocorreram e ainda ocorrem.

Os agentes antimicrobianos no tratamento de doenças infecciosas podem ser divididos em aqueles obtidos de microrganismos, chamados de antibióticos e os obtidos não naturalmente, apresentando compostos químicos sintéticos e semi-sintéticos chamados de quimioterápicos. Neste conjunto, estes produtos podem ser chamados também de antimicrobianos quimioterápicos. Entretanto este termo não pode ser genericamente confundido com desinfetantes, outros agentes químicos que também possuem atividade antimicrobiana, porém extremamente tóxicos como medicamentos.

Os antimicrobianos possuem atividade anti-bacteriana, anti-fúngica, anti-parasitária, anti-viral e anti-blástica (usualmente utilizados no tratamento de neoplasias ). O resultado é a morte microbiana (microbiocida) ou causam inibição de crescimento (microbiostático). Existem antimicrobianos de largo espectro, que têm atividade contra diversos microrganismos, e os de curto espectro que agem contra poucas espécies e os específicos para determinados grupos bacterianos. Os antimicrobianos podem ser agrupados em betalactâmicos, aminoglicosídios, tetraciclinasrimfamicinas, macrolídios,cloranfenicol, quinolônicos sulfonamidas, trimetropim e metronidazol. 

A diversidade da estrutura química destas drogas conferem farmacodinâmicas e farmacocinéticas variadas. Certos compostos apresentam alta toxicidade e são aplicados às vezes apenas topicamente ou após a sua administração, os pacientes devem receber monitoramento hospitalar. Além disso, deve ser considerada o tipo e a localização da infecção, tipo de microrganismo envolvido, tipo de infecção, a via de inoculação (intramuscular, venosa, oral ou parenteral ), dose, peso, idade, existência de gravidez ou outro estado do paciente. A associação de antimicrobianos é realizada em situações não usuais e esta alternativa deve ser bastante criteriosa. Pode ocorrer um sinergismo ou antagonismo na atividade antimicrobiana entre as drogas. Em algumas infecções importantes onde há facilmente o diagnóstico clínico administra-se o antimicrobiano sem o exame laboratorial, pois alguns antibióticos são de largo espectro e o controle da doença deve ser rápido.

Em situações menos frequentes ainda, os antimicrobianos podem ser utilizados na prevenção de infecções como nos procedimentos pré-cirúrgicos ou em indivíduos que se dirigem a locais onde existe uma epidemia conhecida e a vacinação é ineficaz ou não existe tempo suficiente para adquirir proteção pela vacina.(ex. militares, grupos de pesquisadores, expedicionários ou voluntários que se dirigem emergencialmente a um local com epidemia).

Considerando a importância da toxidade seletiva apresentamos resumidamente os principais mecanismos de ação dos antimicrobianos contra bactérias e que servem como modelos.O mecanismo de ação dos antibióticos possuem os seguintes principais alvos na célula bacteriana;
a) Síntese da parede celular
b) Interferência na integridade da membrana celular
c) Interferência na síntese proteica
d) Atividade anti-metabólica
e) Síntese e integridade de ácidos nucleicos.

Parede celular:

Esta estrutura inicia sua síntese intracelularmente na formação de seus percursores seguida de etapas de transporte através da membrana e a sua finalização. Assim a penicilinacefalosporina ,monobactâmicos e carbapenemas são conhecidos como antibióticos betalactâmicos que são estruturalmente semelhantes à transpeptidase enzima que permite a obtenção da rigidez da parede. Estes antibióticos por competição substituem a atividade da transpetidase e interferem principalmente na rigidez da parede levando a célula a lise osmótica. De maneira geral as bactérias gram positivas são mais sensíveis. Especialmente estafilococos e estreptococos. Outros mecanismos de ação das penicilinas são descritos como a sua fixação as “proteínas fixadoras de penicilinas (PBPs) e na ativação de autolisinas. Deve-se no entanto, lembrar de que, se a bactéria encontrar-se em ambiente isotônico a célula bacteriana pode sobreviver e se multiplicar em forma de esferoplasto ou protoplasto. Ainda neste contexto temos os Mollicutes (micoplasmas) que também são resistentes à estes antibióticos por não possuírem naturalmente a parede celular. A bacitracinacicloserinafosfomicina e a vancomicina interferem na síntese da parede celular interferindo nos percursores da parede celular. A bacitracina por exemplo, interfere na etapa do transporte dos percursores pela membrana tornado-se portanto relativamente tóxica para célula do hospedeiro pois as membranas biológicas são semelhantes. A bacitracina pode ser utilizada topicamente em forma de pomada nas infecções cutâneas, mas não nas sistêmicas.
A penicilina em termos de toxicidade seletiva, pelo mecanismo de ação, seria um antibiótico ideal, pois as células humanas não possuem a parede celular. Os efeitos colaterais (alergias) das penicilinas são mediados por mecanismos de resposta imunológica do hospedeiro à droga.

Membrana celular:

Esta estrutura pode ser outro alvo microbiano, mas a toxicidade seletiva torna-se mais crítica pela semelhança das membranas celulares entre eucariotos e procariotos. As polimixinas,  por exemplo, são polipeptídios cíclicos e agem como detergentes catiônicos rompendo a estrutura fosfolipídica das membranas. Estas drogas possuem melhor eficácia contra bactérias gram negativas, especialmente Pseudomonas aeruginosa. A Anfotericina B e Nistatina são anti-fúngicos que apesar de agirem sobre o ergosterol das membranas celulares dos fungos, possuem também toxidade ao hospedeiro. A anfotericina B por exemplo é administrada sob monitoramento hospitalar. Os Cetoconazóis inibem a síntese do ergosterol e são utilizados no tratamento de micoses superficiais e sistêmicas.

Síntese protéica

Diversas drogas interferem a síntese proteica sem interferir nesta maquinaria em células  eucarióticas principalmente pela variação das subunidades ribossomais. Contudo deve-se lembrar, que os ribossomos de mitocôndrias são semelhantes e por esta razão alguns antibióticos podem apresentar hepatotoxidadenefrotoxidadetoxicidade vestibular no 8° nervo craniano entre outras interferências.

A)Atividade na subunidade 30S

  • Aminoglicosídios– Estreptomicina, Neomicina, Canamicina, TobramicinaGentamicinaSisomicinaAmicacina e Netilmicina são derivados sintéticos da Canamicina Sisomicina respectivamente. Estas drogas bactericidas são pouco absorvidas no intestino e portanto, não devem ser administradas via oral. Basicamente estes compostos ligam-se as proteínas ribossomais 30 S resultando na inibição da iniciação da síntese proteica ou na produção de proteínas defeituosas decorrente da leitura errada dos codons. A estreptomicina é utilizada na terapia da tuberculose causada por bactéria multi-resistente e a Gentamicina pode ser associada com penicilina G por exemplo contra enterococos.
  • Tetraciclinas  Antimicrobianos bacteriostáticos atuam basicamente na inibição da incorporação de aminoácidos na cadeia peptídica do RNAt. Apesar destes compostos inibirem igualmente a síntese proteica de células procarióticas e eucarióticas, as bactérias mostram-se mais susceptíveis as tetraciclinas do que células humanas. As tetraciclinas interferem na microbiota normal causando diarreia e na coloração dentaria, pois são agentes quelantes do cálcio. Desta maneira este antibiótico é contra-indicado para gestantes.

B)Atividade nas subunidade 50 S

  • Cloranfenicol Possui largo espectro de ação (bactérias gram positivas e gram negativas). Este antimicrobiano é bacteriostático contra Salmonella thyphi , mas é bactericida contra Haemophylus influenzaStreptococcus pneumoniae Neisseria meningitidis. Basicamente a droga age inibindo o alongamento da cadeia peptídica. Esta droga possui toxicidade sobre a medula óssea e um a cada 30.000 pacientes que recebem altas doses podem desenvolver anemia aplástica irreversível.
  • Eritromicina e derivados (macrolídios) – Bacteriostático de amplo espectro, adere à unidade 50s e bloqueia o deslocamento do RNAt após a formação da ponte peptídica. A droga possui toxicidade menor e é utilizada via oral nas infecções gastrointestinais.

Clindamicina – Bacteriostático usualmente utilizado contra anaeróbios. Impede a formação da ponte peptídica por um mecanismo desconhecido, esta droga não adere a unidade 60S de células eucarióticas. Causa supressão da microbiota intestinal favorecendo o desenvolvimento de amostras resistentes Clostridium difficile que por sua vez elimina uma exotoxina e causa pseudomembrana no cólon.

Antimetabólitos

  • Sulfonamidas- Bacteriostáticos análogos ao ácido paraminobenzóico(PABA) e por competição interferem na produção de ácido fólico, principal doador de carbono na síntese de nucleotídios. As células humanas são incapazes de sintetizar seu próprio ácido fólico e portanto, possui toxicidade seletiva ideal. Utilizada no tratamento de infecções urinárias por E.coli, otites por S. pneumoniae ou H. influenza em crianças, shigeloses, nocardiose e cancro mole. É também utilizada no tratamento da toxoplasmose e pneumonias. Raramente causa febre medicamentosa, exantemas e supressão da medula óssea.
  • Trimetropim- Inibe a síntese do ácido fólico em etapa posterior desta via de síntese (inibe a enzima dihidrofolato redutase). Usualmente utilizado em associação com sulfonamida, pois resulta em efeito sinérgico. Com espectro e funções semelhantes das sulfonamidas a combinação é utilizada também na profilaxia de infecções oportunistas em pacientes granuloleupênicos.

Ácidos nucleicos

  • Quinolonas- Bactericidas que inibem a ação das girases bacterianas. As girases de células eucarióticas são diferentes das células eucarióticas e portanto apresentam toxicidade seletiva. As girases impedem o enrolamento do DNA. Assim temos a norfloxacina, ciproflaxicina entre outras quinolonas. Utilizada em infecções respiratórias, intestinais, urinárias, tecidos esqueléticos e moles. O ácido nalidíxico é o menos eficaz e pela sua propriedade de se concentrar na urina é usualmente utilizado no tratamento de infecções urinárias.
  • Rifampim- Bloqueia a síntese de RNAm inibindo a polimerase das bactérias e não das células humanas apresentando também toxicidade seletiva. Inicialmente utilizada no tratamento da tuberculose em associação com outras drogas e na profilaxia de contactantes com indivíduos com meningite meningocóccica ou por Haemophilus influenza. É usada em combinação com outros antimicrobianos contra bactéria mutantes. É uma droga de cor vermelha e portanto um pigmento de cor laranja é eliminado no suór, saliva, urina de indivíduos medicados com este antimicrobiano. Rifabutin, um derivado do Rifampim, é utilizado na prevenção da tuberculose por Mycobacteruim avium- intracelulare em pacientes HIV positivos.

    Antimicrobianos como a Isoniazida, Metronidazol e Pentamidina  e outros, os mecanismos de ação são pouco conhecidos.